terça-feira, 11 de novembro de 2008

Hoje é o dia da minha morte.

hoje quero todas as bebidas embriagantes do mundo
todas as dores líquidas do mundo
quero embriagar minhas mágoas
todas as mágoas do mundo em um grande copo de cerveja,
quero anestesiar meu sorriso
destilar meus ódios e minha bílis
anestesiar aquele seu sorriso mecânico
quero as alegrias falsas e os prazeres sem identidades,
hoje e somente hoje tenho liberdade para amar,
e andar por aí
livre de tormentas
sem aquele zumbí
hoje não quero nenhuma filosofia
quero as alegrias dos sentidos
hoje os sentidos não enganam
quem engana os sentidos sou eu
hoje quero as gritarias
das igrejas pentecostais
as loucuras da religião insana
hoje permito-me tudo em dose cavalar
porque hoje é o dia da minha morte.
Quero as promessas de ressurreição,
para sentir até onde suporta meu paladar
quero o mais iracional dos beijos
e nenhuma certeza científica
pois estou farto
de pisar em espinhos,
de andar sobre algodão,
farto do calor do sol
e de nenhum calor humano,
quero uma bebida
que coagule
meu cérebro,
que estanque a dor,
quero uma garrafa
cheia do teu silêncio,
do teu desprezo
da tua insignificância
chega de luzes
quero um pouco de escuridão

nosso fim

Aquele garoto que era lindo
era lindo
todos gostavam dele
que tinha olhos verdes
verdes como o mar
aquele garoto que tinha o sorriso
que tinha a beleza
mais bela que tinha
aquele garoto que ensinei
a pilotar motocicleta
a andar de motocicleta
caiu, levantou, bateu a poeira
sorriu, procurei por ele
disseram que morreu,
uma árvore lhe caiu em cima,
uma ávore o matou
mas como pode
mas como pôde
uma árvore.
O garoto cresceu,
virou homem,
comprou boiada,
derrubou a árvore que o matou
fui ao cemitério,
cheiro de vela
rezei seu nome
acreditando que assim
pudesse ressurgir
não adianta lutar contra o destino
todos iremos
para o mesmo fim.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Cantico V

faço bolsas de saco de estopa
e visto-me delas
minha nudez não merece revista
não sou alguém que mereça atenção
não sobrevivo a um ataque de moscas

quando de madrugada os galos cantam
é para que eu não esqueça
da miséria que me rodeia

sou um sonâmbulo
que morre de insônia
de envelhecido
estranhas coisas
ocorrem em minhas entranhas,
nascem-me cabelos nos ouvidos
os músculos amolecem
as artérias se rompem
os dentes apodrecem
ainda em uma boca viva,
os cabelos caem
deixando à mostra uma cabeça horrenda
o ânus já não agüenta
a febre das fezes

não fumo maconha
não tomo cachaça
não uso cocaína
e nenhuma droga cara
leio a Bíblia
mereço morrer de morte abandonada
sou uma besta de bunda para a lua
para a sua.

Cântico IV

este poema
é uma piada
tudo o que faço
vale pouco
ou nada
tudo o que tenho
é uma filosofia
que não vale
um empenho
não vale nada.

as únicas flores que aprecio
são as de plástico
roubadas de cemitérios
adoro flores de catacumbas
aquelas de tumbas
desoladas sem nome
aquelas que não passam de monturos
de defuntos esquecidos
roubo flores dos ricos
e levo às tumbas pobres
sou o herói do cemitério

os mortos são os únicos
que merecem minha admiração

Cântico III

meu deus é uma caneca
meu amor é uma boneca
de plástico inflável
inflamável.
sou descrente
totalmente
não acredito nem em guerra
não creio em contos
não como carne de peixe
não palito os dentes
não penteio os cabelos
não sei se sou gente
talvez seja indigente.

não quero festa
nem de aniversário
nem no dia da morte
do meu adversário
não quero enterro enfeitado
quero tábua de caixão
na rua pela mão
levado carregado.

Não tenho motivo
para riso
não acredito em meu poema
não acredito em dilema
meu livro não é poema
meu livro é dilema
mataram o prefeito de Diadema

a árvore viro tábua
o rio virou areia
o filho virou poeira
a filha virou assombração
vivo ao relento
em terra desconhecida
onde o sol derrete
cérebros e pensamentos
lamentos.

Cântico II

não sei falar de amor
não vou falar de amor
nunca soube falar de amor
nunca fui amado.
tudo o que tenho é dor
tudo o que me sobrou foi dissabor.

Meu nordeste
não tem musica
meu leste não tem sol
meu sul
só tem vento frio.

Minha terra
não tem palmeiras
alias não tem arvore nenhuma
tem só plantação de soja
não sei comer soja
não sei pra que serve tanta soja
se o que quero é um pouquinho de feijão com arroz.

Minha terra
não é terra
não é minha
é latifúndio
meu país não é país,
meu povo não é povo
minha gente não tem dente
aqui ninguém sente
inspiração de poeta
quem não tem comida
não tem meta
sem nada na barriga
perde-se a reta
quem já teve meta.

Cântico dos Cânticos

tem uma asa de barata
voando em minha cozinha,
um bando de velhos
num calhambeque velho
falando besteiras na tv.

nenhuma comida na panela
o arroz está caro
o feijão está um veneno
a carne de vaca
é vendida pelo preço da carne do boi
e a carne do boi é vendida a preço de ouro.

somente batatas me restam
batatas podres.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Para o meu amor com muito amor.

te amo meu amor
você é meu guia
eu sua estrela guia.
sou seu porto seguro
refúgio para seu cansaço,
você é a luz do meu caminho,
vida da minha vida,
você é toda a minha fé,
razão da minha existência.

queria dizer às estrelas
o quanto te adoro
queria dizer ao oceano
o quanto vives em mim.
queria dizer ao sol
o quanto seu amor me aquece,
queria dizer às pedras
como sou feliz por saber que existes.
queria dizer à lua,
que seu brilho
é o brilho
dos olhos seus.

te amo amor meu
te amo meu amor.
e digo ao universo
a cada segundo,
que te amo
que te quero
que vives dentro de meu coração
que nunca o amor
conheceu amor tão profundo
quanto este que lateja dentro de mim
nunca o amor conheceu
amor tão profundo
quanto o meu
nunca o amor experimentou
beijos tão doces quanto os meus

sou toda sua
sou sua alma
sua guia
sua calma

te amo amor meu.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

das perfeições de teu corpo

nas curvas bruscas dos teus músculos,
na ossatura do teu corpo,
nos recônditos e
nos desenhos de mundos que fazem tua respiração,
no segredo oculto dos teus testículos,
estão revelados,
todos,
um a um,
os meus desejos,
os meus anseios,
os meus medos e também
meus sonhos e segredos,
enfim,
toda minha alma clama pelo teu sêmem.

quando dormes,
velo teu sono
e certo que sonhas
espero que comigo a navegar seus riachos.
quando caminhas,
admiro seus passos
e no trabalho braçal da tua labuta
admiro o suor
e a força bruta
que oculta
revela o afago do afeto
que demonstras em meus lençóis.

no tecido escondido do teu sexo
levas oculto o sabor do meu beijo
e sei que me amas.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

o amigo morto


aquele garoto lindo
que tinha os olhos verdes
verdes como o mar
aquele garoto que tinha o sorriso
que tinha beleza
mais bela que tinha
aquele garoto que ensinei andar de moto
aquele garoto que caiu
levantou
bateu a poeira
procurei por ele
disseram que morreu
uma arvore caiu-lhe encima
uma arvore o matou
mas como pode
mas como aconteceu
uma arvore.
o garoto cresceu
virou homem e comprou boiada
precisava plantar pasto
derrubou a arvore e morreu
o meu garoto
e eu nunca disse
que o amava.
fui ao cemitério
terra triste
lá no fundo
a ultima sepultura
li alto seu nome
quase como acreditando
que pudesse ressuscitá-lo
acendi uma vela
rezei e chorei
eu o amava e ele morreu.



a tarde

uma andorinha
não faz verão
sozinha
cucuru-cucu
paloma
tampouco um homem
não se faz
em curto tempo
tempo feliz.
ter saúde
ser justo
são
coisas nobres
mas doce
é ser feliz
e ter a quem amar.
um tolo de barbas
grita para a multidão
calada
encostada
no poste
enfrente ao sobrado
que a vida
é uma ilha
não sabe o tolo
mal sabe a multidão
que nenhum homem
é uma ilha
quando esta só.
o silencio sorridente de São Paulo
diante da chacina
o horror silencioso do Rio de Janeiro
diante da chacina
o silencio sorridente do brasil
diante da chacina.
nada disso é um horror
horroroso é estar só.

um dia um desarranjo.


Um desarranjo
intestinal me ocorre.
enquanto escrevo estas linhas
o suor escorre
pela fronte
em brasa que queima
como a alma
que espera
pelo inferno que purgará
como o sexo
que espera
o desejo
que lhe aplacara.
como o anus
que deseja
o pênis
que o completa.
um arrepio percorre
a espinha
desde a nuca
até o anus
lembrando que sou homem
fraco e desejo
o desejo indizível.
um arrepio percorre
a espinha
pois lembro
que amanha
posso e não posso
não estar vivo
ou morto estar.
que coma o que quer
hoje
que o amanha a Deus pertence
e que o mundo saiba
não tem problema
que o único que leva o homem
dessa vida é,
o que comeu e o que bebeu
já disse quem um dia foi sábio
e morreu,
e um dia foi
um dia.

café descafeinado


o café tem cafeína
se for doce tem sacarina
o cigarro não tem só nicotina,
o mal vem acompanhado
de uma centena de más sinas
a carne é a carne
e em si
traz todos os males
mesmo temperada
com temperos
leves continua carne
o pão é o corpo
e o corpo tem desejos
que os desejos escondem
o vinho é o sangue
e o sangue derramado
não adianta ser chorado
como o leite imperfeito
da vaca adoecida.
o sêmen vem do sêmen
e traz em si
os males do mundo.
Não há chance para quem tem coração
só na pedra estará escrito
o contrato que nos faz amantes
então hoje
como antes
de ter te visto
trago no peito
as dores do mundo.
trago no trago
carrego na carga
levo na alma
a dor do peito
de ter te amado
nada feito
tudo desfeito
e por despeito
matas-me todos os dias
quando acordo
lembro
do esquecimento
de ter sido
teu.
o amor que amo
não pode ser dito
por ser maldito
e na bagunça
das dores do mundo
meu peito dói
de dor dilacerante
e de hoje em diante
não direi não
terei sorriso
pras horas exatas
terei choro
pro tempo inexato
terei eu
pra dar
pra você
descer o pau
já que não sabes falar
bem
nem de quem
te quer bem
humilhas quem te afaga
e com unhas de tigre
dilaceras como leão
as paredes do meu coração
seras maldito
como as dores que sinto
as dores do mundo.


amor


O que é o amor senão uma completa viajem
uma viajem sem volta
um ir e nunca mais voltar
ou um voltar-se completamente diferente
um não-retorno de si mesmo
o que é o amar
senão um completo desterro
desterro de si mesmo
de mim mesmo por dentro e fora
do eu mesmo jamais de mim
o amor é completo inexistir
é dar-se por completo
é entrega sem reservas de si
o que é o amor
senão uma ilha
onde o outro é o oceano
onde o outro é o resgate
que vem por inteiro
e leva para dentro de si
para um novo existir
um novo nascimento
uma vida entregue ao outro
amar é quando o outro
é a salvação de mim
amar é saber-se perdido
e não buscar abrigo
é desterro
exílio de si mesmo
seqüestro-relâmpago
em instante eternizado
sem resgate
é saber o outro
injusto bandido
e a si mesmo cativo entregue
amar é fel que se toma rindo
é remédio amargo
que se bebe sabendo que não se tem cura
amar é quando se esta morrendo
o desejo de curar-se de si
amar é o que sinto quando você vai embora e não volta mais
amar é saber que te encontrei mas que tenho que esperar
amar é saber que tudo o que vivi antes de te conhecer
não foi viver
foi morrer.
e agora que te conheci
tenho que não viver
por que não podes te entregar
pertences ao que dizem.
não somos o que somos
não podemos amar
como sabemos
por que amar é o que dizem que é amar
e não o que sabemos que é amar.
melhor não amar
mas mesmo assim espero
como a semente espera no chão
a hora da chuva para nascer.
em terra seca não se vive de amor
amar é esperar
e espero.
espero teu sorriso
teu jeito de falar
teu jeito de andar
teus olhos me olharem
teus lábios me beijarem
teus braços envolverem os meus
num abraço de reencontro
num encontro de meus olhos
com os teus
mas não demores
amado meu
não tardes
por que a noite vem
o silencio bate na porta
de minhas pupilas cansadas.
não permita
que o tempo
construa tempo em nos
não deixe que o tempo em nos
seja o oceano distante de nos
venha logo meu amado
para meus beijos
que te darei
todo teu
A razão e a parcela de mim
Entre a razão
e a razão
fico com
minha pequena
parte de ração
entre o amor
e o desamor
prefiro
minha
própria dor




aquele dia

luz do sol
luz do meu olhar
bastou que se esquecesse
de mim
e
foi-se a luz
e
meu dia anoiteceu
bastou que se esquecesse
de mim
e
triste está meu sorriso
sem teu sorrir
se você diz
dia bom
meu dia acende
festinhas em mim
com doces
de gergelim
luz do meu olhar
encanto de minha vida
amor do meu coração
como um doce
ainda sinto teu beijo
meus lábios ainda sentem
ainda estão quentes
do teu calor
mas nosso amor
é água de mar
é oceano distante
é mar bravio
onde não se pode navegar
mas
não há permissão para amar
ama-se simplesmente
mas o amor
não se entende
ama-se e sem dizer
se diz que é amar
o amor não tem tempo
todo o tempo
é tempo de amar
é tempo de se entregar
e as diferenças do tempo
dizem do tempo
não de amar
as diferenças dos dias
as diferenças dos anos
são somente marcas
são somente pedras
caladas
na beira da estrada
não deveriam falar
mas falam
e
querem calar
o direito de amar.
que tal se fugirmos
que tal se sumirmos
ninguém nos veria
se invisíveis ficássemos
os meus dias
meu amor
são mais dias
os seus dias são
meus dias
e ninguém
deveria dizer
desse amor
que é proibido
que é isso ou aquilo
esse amor
é o amor
que sinto em meu peito
e não tem mais jeito
de calar.

o seu mundo


olhei no teu olhar,
atinei.
o mundo tinia
de tilitidade.

tereza e o mundo.

terezinha fumava
todos diziam:
cuidado que cigarro mata.
certo dia Tereza
atravessa a rua
não vê o ônibus
que também mata
mata mais que cigarro
mata mais
que mau olhado
e dor de cotovelo
ajuntado.
trinta anos depois
ainda sinto a falta de Tereza
raro sorriso alegre
foi embora de ônibus.
odeio ônibus
apesar de precisar deles
fumo todos os dias
apesar de tentar o contrario
todos dizem:
cuidado, cigarro mata.
ônibus desgovernado mata
só não mata quem
já morreu de tédio
dessa vida besta
Tereza sabia
que ônibus matava?
acho que Tereza
viu aquele ônibus
é que cansada de esperar o cigarro
tomou o ônibus do lado errado
da forma certa.

menino do interior

sou menino sim
daqueles grandes
que perdeu a infância.
sou menino sim
e dentro de mim
tem um jardim
cheio de brincadeiras,
é só procurar
desembrulhar
montar
e brincar.
sou menino sim
e dentro de mim
tem um rio
bom de nadar.
tem vara e anzol,
tem peixe
que deixa
brincar de pescar.
tem menina também
com olhar
de quem diz
sou infeliz
sou difícil de amar,
mas que quando beija
coração pula tanto
que haja esperteza
pra ninguém notar.
sou menino sim
e dentro de mim
vive um menino
sem medo de amar,
menino levado
menino sapeca
de vidraça quebrar.
menino anjinho
com dedinho
pequenininho
sorriso maroto
de anjo barroco
sem medo de amar
sou menino sim
e dentro de mim
tem outro menino,
homem grande,
fácil de amar
é só me olhar
pra casa levar
e de amor me matar.

misérias


queria falar de rios
dos pássaros
das flores
das chuvas de outono
do inverno e do verão
e de sonhos.
mas a poesia cala
pela dor da bala
da cartucheira
do machado
da moto-serra
que mata
que serra, serra-serra,
serrador
serra o papo
serra a mata
serra a vida
serra a morte da mata
queria falar de verde
queria falar de verdade
mas de verdade
tem-se sangue
de gente
que morre matada
na empreitada
da plantação
do homem infeliz
que se diz dono
da terra infeliz
desse infeliz
dono do chão
pelo qual se morre
infeliz morte.
queria falar de amor
mas trago um imenso buraco
no peito feito à bala
que a vida abala
que abandona a vida
para ser taramela de cemitério
queria falar de amor
mas o que sinto não corresponde
ao amor de sentes
queria falar de amor
mas o peito sangra
ferido pela bala
disparada pelo homem de farda
que protegia
o que se fazia
fazenda do rico.
queria falar de amor
mas sou apenas criança
que fugia da guerra
que não existe
para criança rica
de cidade grande fechada
de condomínio protegido
com cão e câmara
"sorria você esta sendo filmado’’.
meu poema se cala
numa poesia de Maiakovski.
matada a machadada
segue calada
rumo ao cadafalso da forca
enquanto o carrasco
olha-me pelo furo da mascara
que protege de meu choro
será que o carrasco também chora?
minha poesia segue calada
tenho uma ferida no peito
feita a machadada.
queria falar da doçura do mel
mas tenho somente o fel
queria falar de flores
mas o que tenho é miséria
queria falar de amores
mas tenho dores
queria falar das matas
queria falar dos pássaros
queria falar dos meninos felizes
mas sou um menino infeliz
de sorriso triste
de menino pobre
com frio e fome.
não tenho amor
tenho somente dor
o que me faz falta
é uma arma bem grande
dessas para endireitar o mundo
aí então todo mundo
vai ouvir falar de mim
vai falar do menino pobre
que matou o menino rico
sem piedade
já que não conhecia piedade
nunca ninguém teve piedade de mim
Senhor, tende piedade de mim
pobre e desarmado.

das coisas que não dizemos

do meu ânus
sai um poema
que fala de amor.
cago poesia
como poeira.
mas é tanto açúcar
tanta insulina
que já não agüento.
que as artérias se dilatam
que o coração não bate
e o pulso pulsa
mas o pênis não levanta.
mais uma dose de nicotina
mais um pouco de cafeína
mais uns quantos
comprimidos de anfetamina
coloridos de todas as cores
tudo controlado
tudo dentro das normas
tudo estabelecido
e carimbado
receitado pelo doutor
e aceito na farmácia
porque é preciso
que suporte
o nó da gravata
a mó do moinho
a corda da forca
e o aviso de concordata.
mais uma dose de vinho
mais um pouco de álcool
um comprimido para a dor de cabeça
um sorriso,
disfarça,
o telefone que toca
o amigo que liga
é preciso,
ser cordial,
ou então pular da janela
de cara no chão
sujar a rua
com a noticia do dia.

tua boca

quando teu olhar
olha minha nudez
queima em fogo
minha embriaguez
e então percebo
que estou pronto
quando sua boca
fala de coisas
que não sei o que são.

teu beijo com gosto de broca na boca

teu beijo deu-me essa dor de dente
que tenho como louco demente
no canto da boca inalcançável `a broca
teu beijo nada decente
teu beijo nada como dente
na ponta da língua que busca o buraco do dente.
no furo do céu da boca
teu beijo de banguela.
tem gosto de berinjela
estragada de salada
de ontem.

o navio que atravessou o mar

o negro negrume da pele
tinta pincelada
no chão da sala
na imensidão
da tela.
o negro negrume da pele
energia máscula
do músculo
que aponta
a boca que conta,
marca o púbis
que baila
ao encontro da boca,
desnudo, desvestido,
montado em pelo,
pervertido.
no negro negrume da pele
no escuro negrume da noite
o frio gume da espada
qual animal que cavalga
em desabalada cavalgada
o cavalo encilhado
de costas pro chão
no chão do quarto
onde tudo se cala
onde nada consente
e tudo permite
pois sabe que o dia vem
e a pressa apressa
o gozo na cara,
o sorriso na boca que cala.
Lá fora,
quando o dia vai alto,
pode-se andar de salto
o navio atravessou o mar
deixou o outro
do outro lado
do outro lado do mar.
Do lado de cá
o desejo
da boca que aponta
o púbis que passa.

no campo

entre pastos e vacas
cheiro de terra
estrume
a cruz e a espada
não são mais
rastelo e enxada
a espada e’ o negrume.
coqueiros, castanheiras
babaçus e corredeiras
minha terra tem palmeiras
mas não tem mais sabia’.
mogno e seringueira
todos sabem
virou mesa
virou parede
virou cadeira.
Minha terra não tem verde
não tenho mais o que cantar
minha terra pegou fogo
para capim e boi prantear
Arvore virou cama inglesa
goiabeira virou prateleira
rio virou riacho
riacho sumiu
o homem,
que bicho imbecil,
reproduziu.
virou erva daninha
nasceu em todo lugar
brotou, cresceu
tudo invadiu
matou índio
matou a parteira
que o pariu
e agora ri de si
encolheu.

chuva

Todo o dia chove
Não se pode
sair não se pode
não se pode
buscar um amor
entre os que caminham
pois já não caminham
paralisados estão os caminhos
tristes parados os caminhantes
molhados
caminhantes escondidos
solitário olho da janela
a fina chuva que molha bobo lá fora
e vejo o tempo que esvai
por entre dedos
de amores perdidos.
Poderia buscar um amor
entre os alegres
que saem ao sol
com seus longos cabelos encaracolados
seus sorrisos virgens
seus barulhos de multidão
poderia buscar um amor
poderia sonhar um amor
mas chove o tempo todo
nesta minha vida estúpida
de amante velho e abandonado.


A velhice tal como ferrugem
destrói os dias que restam
dos poucos dias que ainda prestam.

translúcido

essa cidade me sufoca
essa gente me apavora
quero um mundo silenciado
onde não more o medo
onde de raiva não se morra
de desespero não se viva
de morte não mate
de carro não atropele.

Essa cidade me sufoca
sufocado permaneço atento
vejo morrendo
lento
o monstro da lagoa.
essa cidade me sufoca
essas ruas me oprimem
o calor do asfalto mata.
a cabeça faz latejar o pensamento
o suor faz apodrecer a genitália
o cheiro de pescado podre de mercado
atrapalha o sonho de amante.

Quente e húmido
o clima
molhado e apodrecido
o corpo
um banho urgente
e estará pronto o amante
no frescor dos dias
na degustação inocente dos apetrechos do amor
comer como quem come
banana madura no ponto
mastigando desde a ponta
na loucura do desejo matinal
e a cidade já não me oprime
e o sinal já não me detem
e o assaltante já não me assusta
e a policia já não me contem
sobrevôo por cima das cabeças
o pensamento fresco como os ovos
degustados com a ponta da lingua
essa cidade
antes podre
agora alegre
de felicidade explode
diante do sorriso do amado
nu na cama deitado ao lado
olhando o olhar nos olhos
a língua solta na boca
bebo a água buscada na fonte
e já nada me apavora.
no silencio do mundo lá fora
a paz voltou,
como sonho de miss universo.
desfaleço então num abraço
sou primo da primavera
já não há o mormaço
aberto espaço
acordo e esta ali o sorriso
franco e aberto
frutaria inteira exposta
degustação renovada
e amo essa cidade
o calor já não oprime
nos braços dele
recomponho o cansaço.
O amor tal como remédio
que cura qualquer mal
pode ate matar
mas também
faz feliz qualquer mortal.

cuiabanalia

desgraçadamente inútil
viver neste tropico tal
sem amor e sem camisa
neste calor infernal
calor que nos habita
tirando a vontade toda
já pouca que me habilita.
vontade para o trabalho não há
ainda bem que tem
biblioteca publica com ar-condicionado
ligado, que me consola
não sei o que farei se ficar velho
não tenho nada guardado
isso se velho ficar
não morrendo antes
de dor de cabeça e tonteira
provocando vômitos literários
de calor fritante de ovo no asfalto
do passeio sem arvore plantada.
Na terra da moto-serra
machado vira prefeito
arvore vira
mais nada que enfeito.
coitada cuiabanalia infantil
fritada em cidade canalha
dia a dia na escola
caderno imbecil
só de quatro mesmo para agüentar tanto calor.
vou-me embora pro Panamá
lá sou amigo do alcaide
lá poderei suportar a solidão sem os lacrimejos da pele.

quatro e trinta

quatro e trinta
longe vai a noite
bruma fria extinta
madrugada finada
que sono
que nada
não dorme o Deus de Israel.
e o deus de meu pais
será que dormiu?
Mas não sou anjo
nem amigo do arcanjo Miguel
quisera ter sono menino
para ter pesadelo
bem pequenininho
não dorme o Deus de Israel
mas não sou judeu
que tem Jeová
nem árabe
que tem Maomé
estou no mato sem gato
estou em Cuiabá
sem picolé
sou do lado de cá
e nenhum deus vive aqui
Todos temos um monstro
maior que nos mesmos
tudo seria mais fácil
se houvesse coragem bastante
se não fosse trabalho
puxar o gatinho
de encontro ao ouvido.

Inúteis e úteis

guardo as roupas
que não me servem
pra quando você voltar
são inúteis
hoje
desde que você se foi
como usar colorido
se por dentro estou sem cor
como usar azul
daquela camisa de praia
se estou
deserto como a praia
lotada de fim de semana
sem você não tem ninguém
como usar no ponto
se estou gordo
para compensar
o mal que sua ausência me faz
Ainda compro as margaridas
flores de teu sorriso
e apesar da tristeza
que provocam em mim
pode ser que você volte
sem avisar encontre
sobre a mesa
as flores do teu olhar.
No dia em que você voltar
vou pedir para o carteiro anunciar
e não quero saber
não perguntarei
onde andastes
onde estivestes
ou se amou alguém
quando você voltar
mesmo perto de morrer
viverei para saber
somente o que me contar.

O pastor e o poema.

O pastor encanta
enquanto
a igreja canta
com seus contos
de anjos
e de fadas
enquanto aguarda
uns contos
de reis,
uns pelos dízimos
outros pelas ofertas
e deus cala
diante do altar repleto

refeito
o pastor
ator perfeito
dono de seu canto
encantado com seu próprio encanto
mordido pela serpente
que Eva mordeu
enquanto Adão
encanta o canto
entoa o canto
no altar
do alto louvor
ao deus
do dinheiro
depositando em banco
estrangeiro em terra santa.

Louvemos ao Senhor com um novo cântico
enquanto entoa o torto
outro conto.

Os poemas e as palavras. .........(para Raquel)

quero fazer um poema
mas as letras escorregam
as palavras caem
moles
cozidas
como macarrão na concha
da panela ao prato.
caem
como macarrão al dente
fora da panela e fora do prato
sujando a toalha nova
da mesa
as palavras são
assim rebeldes e
constituídas de vontade própria
caminham sozinhas
para seus caminhos
errando o caminho
do prato e do poema
talvez se ele olhasse para mim
eu conseguisse
falar dos caminhos errados
das palavras certas
mas ele não olha
preocupado com o barulho do liquidificador
ao redor de seu mundo
que gira entorno
do entorno dos outros
ignora meu poema
liquidifica meu amor
talvez se ele olhasse para mim
mas ele não olha
teme o temor
dos outros
que dizem
que não se deve
amar um amor
assim tão torto.

as palavras que eu usaria
as palavras falariam do amor que sinto
mas, o olhar não sinto,
nas palavras que calam
como calam as gentes
que falam
de meu jeito torto
de amar
o amor
imperfeito e proibido por Deus.
mas se Ele olhasse para ele
e permitisse que eu visse
seu olhar refletido,
meu coração
sentido,
calaria na Palavra
uma palavra
e então
talvez falasse desse amor
num lindo poema de amor
e para o meu amor proibido
cantaria a mais linda canção
de amor
e como o galo rompendo a madrugada
gritaria com toda força
do mais alto monte
que amo o meu amor.

mas as palavras escorregam
e caem da pagina
como macarrão cozido
que desfalecido cai ao chão
e já não pode ser
prato do dia.
E já não pode ser amor
esse amor todo torto.

O Tempo ........ ( para Jéh Lopes)

passou por mim sorrindo
quando ao passar por ele
ollhei de volta
também sorria,
mas no entanto se afastava
como areia entre os dedos
escorria, escapava
ia-se
embora. Embora parecesse
que quisesse dizer algo
Gostaria de poder controlar o tempo
passar novamente por aquele
que sorriu
e novamente
em um encontro furtivo
parar o tempo e
então
poder dizer tudo o que quero dizer
e novamente
olhando nos olhos
dessa vez
sem pressa
apreciando o sorriso
o resultado das palavras
refletidas no olhar
mas o tempo se foi
já não há mais
tempo

O Ovo ou a galinha? ............... para Eros

Cócóri-cócó, Cócóri-cócó,
Cócóri-cócó, Cócóri-cócó,
Cócóri-cócó, Cócóri-cócó,

faz a galinha
cócóri-cócó
da casa da vizinha.


Cócóri-cócó, cócóri-cócó,
Cócóri-cócó, cócóri-cócó,
Cócóri-cócó, cócóri,cócó,
faz a galinha
cócóri-cócó
da casa da vizinha.

Có,có,ri,có,có

có,có,ri,có,có.


Deixou um ovinho,

ovinho azulzinho
botou um ovinho

todo redondinho
a galinha do vizinho

có,có,ri, có,có.
Quem vem primeiro, có,có ?
O ovo ou a galinha ?
Có,có,ri, có, có
Quem vem primeiro, có,có ?
O ovo ou a galinha?

Có, có, ri, có, có


Tem omelete no almoço
Tem bolo na geladeira
Tem gemada com canela
Tem ovo frito na frigideira
tem arroz-doce na panela.


Tudo isso se faz com ovo
Ovo de galinha pra ficar gostoso.

có,có,ri, có, có


Deixou um ovinho,
botou um ovinho
a galinha do vizinho

Quem vem primeiro, có,có ?
O ovo ou a galinha?

A casa com telhado quebrado.

ploc-ploc
ploc-ploc
a casa com goteiras
faz ploc-ploc
faz ploc-ploc

ploc-ploc
ploc-ploc
a casa com goteiras
faz ploc-ploc
faz ploc-ploc
ploc-ploc
ploc-ploc
da telha quebrada
quebradinha e furadinha
caindo a chuva fininha
friazinha e magrinha
plec-plec
plec-plec

cai la fora
cai la dentro
plic-plic
plic-plic
a água do aguaceiro
faz ploc-ploc
faz ploc-ploc

plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc
plac-plac
plac-plac
goteira a noite inteira
goteira a noite inteira
e o menino não dorme
de tanta barulheira
de gota e de goteira

plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc
plac, plec, plic, ploc, pluc

chove a noite inteira
noutro dia
vai a escola
o menino com olheiras
.

Antes. ........................ para meu amigo Kadre Assad.

Antes era o poema
verbo seminal
semem germinal.
Verbo e poema
estavam antes no poltrona
na casa do poeta
antes da introdução atleta.
Surge então o esqueleto
da fêmea lancinante
germinante geminante
lançando gemidos
despertantes penetrantes
do touro adormecido.

Semem em terra fecunda
partida em duas
como bunda.
Nasce então o poema
gritando feito bebe parido
de cabeça para baixo
com o mundo virado
para lua
para sua
para rua
Derrepente um tapa na bunda
desperta para a vida
deusa adormecida
e o poema sai por ai
de peito aberto
coração sinsero
falando da vida
de nenhuma saída
já que a vida
não precisa de saída
precisa ser vivida

de cara para lua
de cara para rua
de peito aberto
rindo da vida.

Baile de fantasias.

Quando ainda menino
um anjo
desses de asa azul
tocou-me
Fez de mim
as cicatrizes que sou
sou o medo
de ser.
sou desejo
de ser.
Sei que sou
mas tenho medo
de ser
ser eu mesmo

por detrás da mascara
do baile de fantasiados.

Jonas e o chicletes. (Para João Helio Fernandes Vieites)

eu, ontem tive a impressão
que Deus queria falar comigo
ai, meu Deus, que medo me deu!
quem sou eu pra falar com Deus?
joguei-me ao mar
um peixe desses grandes
comeu-me.
Que bom!
Deus não vai querer
falar com comida de peixe
que Deus não se rebaixa tanto.
Afinal Deus e´ Deus
Ele na imensidão
eu aqui tão João
Mas lá de longe,
de dentro da barriga,
no âmago do estomago,
eu ouvia Deus chamar.
Putz, que Cara insistente
não vê que não quero conversa?
Mas não adianta
Deus e´ quem manda
e sabe mandar
e manda a baleia vomitar
eu, cara a cara
com Deus na praia
e Ele me pede:
da-me um chiclete,
de tutti-frutti, desses
que tens no bolso
chiclete mascando
saiu qual menino pulando
o Grande Criador pela praia
deixando um hálito lindo
de tutti-frutti
pelo universo inteiro.

sábado, 1 de novembro de 2008

náufragos de nós mesmos

O tempo mudou de repente
as núvens que encobriam o céu
já não falam
de chuva somente
algo mais forte vem por aí
você fala de uma crise na economia
pela vidraça eu olho o tempo lá fora
talvez não haja mais tempo
de fugir da chuva
de fugir do choro
talvez eu queira chorar
com certeza vou chorar.
O vento sopra forte
o frio que vem do sul
na pele um arrepio
faz lembrar como tudo era antes.
Mas já não faz mais sentido
viver das lembranças
de um passado remoto
de dias que não voltam mais.

mas já não faz mais sentido.
pensar que podemos nos salvar
do naufrágio que vai nos separar
como náufragos de nós mesmos
buscamos cada qual o seu lugar
e já não nos falamos mais
O tempo mudou de repente.






terça-feira, 9 de setembro de 2008

A vida na grande cidade.

A vida é uma coisa interessante de se pensar. Cada vez mais ficamos à merce das pessoas que nos influenciam. Queremos ser sinceros mas a forma com que o grupo pensa é que define o que somos então deixamos de lado o que somos e fingimos ser aquilo que o grupo deseja que sejamos. Baita hipocrisia mas se voce quer ter um emprego, uma casa com amigos voce não pode ser sincero, tem que ser falso mesmo.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

A noiva.


lá vem ela
vestida como
a primavera
de cor amarela
sorriso de deusa
na mão buquê de alcachofras
e eu alí ao lado
do padre
esperando
calado
vestido de outono
em pleno inverno
ela caminha
em meio à guerra
entre tiros e canhões
planta árvores
distribue flores
espalha perfume
em deserto de areia quente
seus lábios são refúgio
para sedentos
santa de todos os altares
seu sorriso abre
e cabe em todos os lugares
quando olha pra mim
meu mundo cabe todo
em seu batom
mundo pequeno e frágil
de menino

Viver em Freedoncity



O que tenho percebido é que as pessoas mudam de opinião e isso é muito bom.


Antes do processo de democratização do Brasil, era muito importante desfilar no dia sete de setembro durante o que se chamava desfile militar. Mas é porque era realmente um desfile militar onde o exercito se exibia para a Marinha e Aeronautica e assim reciprocamente.


Hoje as pessoas ainda são muito resistentes às coisas diferentes, acho que por um comportamento muito mais animal que racional, apesar de aceitarem com muito menos dificuldade que antigamente por exemplo, o amor entre pessoas do mesmo sexo, de raças diferentes, de classes sociais distintas, é claro que muita água ainda vai ter que correr embaixo da ponte pra levar o entulho do preconceito embora mas sinto que já evoluimos bastante. E isso se dá muito mais porque as pessoas estão tendo condições de estudar mais, de conhecer novas culturas.


O contato com o diferente nos faz mais tolerantes. Essa gente que tem mania por exemplo de se agregarem em grupos são na verdade as responsáveis, e neste sentido todos nós somos assim, pela formação de guetos ou grupelhos onde o preconceito acaba minando a capacidade criativa das pessoas.É mais uma forma de exclusão dos diferentes. Lembra daquelas escolas "especializadas" em educação para deficientes ou portadores de necessidades especiais? Quer visão mais excludente que essa?


Essa gente não está com nada.